segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

Jazz do Peru

Se o jazz já se tornou uma linguagem universal, não é estranho que haja um grupo desse tipo no Peru. Ao mesmo tempo, se a música norte-americana se espalhou pelo mundo, ela não ficou livre de contatos e misturas com outros sons regionais. Pois é o que ocorre nos trabalhos de vários músicos e grupos de jazz na América Latina. Muitos deles trabalham numa chave híbrida, ou seja, com a mescla dos elementos musicais globalizados e os das tradições locais.
Este é o caso do grupo Perujazz, criado em 1984, em Lima, capital peruana. Um álbum muito interessante é o duplo Perujazz en vivo. Suas qualidades estão na experimentação e na criatividade das fusões dos ritmos e instrumentos peruanos com a linguagem livre do jazz contemporâneo.
A formação é bastante inusitada. Por ser composto de contrabaixo (David Pinto), saxofone (Jean-Pierre Magnet), bateria (Manongo Mujica) e percussão (Julio Chocolate Algendones) – portanto, sem um instrumento típico de harmonia, como piano, violão ou guitarra –, o som do grupo soa bastante original.
As melodias são trabalhadas, em muitas faixas do disco, pelo sax e pelo baixo em uníssono, o que resulta numa sonoridade curiosa. Às vezes, algumas músicas lembram as do grupo Weather Report. As semelhanças estão na presença das percussões (Alex Acuña, também peruano, e o porto-riquenho Manolo Badrena, no caso do WR), na proximidade entre os timbres dos baixos do peruano David e de Jaco Pastorius e nos saxes de Wayne Shorter (WR) e de Jean-Pierre.
No entanto, as diferenças são grandes. Neste CD, gravado ao vivo em 30 de novembro de 2001, Chocolate e Manongo são elementos centrais. É pelos seus instrumentos – entre eles, cajon, djembé, cencerro (gonguê), vibrafone e congas – que flui a alma das tradições musicais afro-caribenhas e afro-peruanas costeiras e andinas. São os casos da marinera, dos toques de santeria (o “candomblé” cubano), da rumba, do mambo, entre outros ritmos utilizados.
Algumas criações, sempre coletivas e baseadas na experimentação e no improviso, homenageiam músicos importantes, entre eles, o beatle George Harrison (composta quando ele morreu), o trompetista do jazz Miles Davis e o cubano Perez Prado, o Rei do Mambo. Uma faixa de destaque é El tren (3ª do disco 2). Nela, as percussões (o cajon e o steel drum, um tambor metálico de Trinidad) imitam a dinâmica sonora do trem, próximo ao que fez Villa-Lobos em Trenzinho caipira. Segundo o encarte do disco, este tema foi tocado num presídio na Itália e preocupou os guardas, pois fez com que os detentos gritassem com as sensações acústicas de liberdade!

O disco é representativo do trabalho do grupo, que já tocou em festivais de jazz na América e na Europa. O fato de ter sido gravado ao vivo faz com que suas experiências apareçam claramente e revelem ao ouvinte todas as atmosferas sonoras criadas por Perujazz.

Nenhum comentário:

Postar um comentário