O primeiro disco de Zeca Baleiro (Por onde andará Stephen Fry?, de 1997) tem faixas interessantes e reveladoras da criatividade desse compositor maranhense que sempre adorou comer doces, balas e guloseimas. Merecem destaque Stephen Fry, Heavy metal do Senhor, Flor da pele, Salão de beleza e o pagode Kid Vinil. Mas, além dessas, uma chama a atenção pelo insólito dos arranjos e da letra: O parque de Juraci, criada pelo próprio compositor e por ele denominada um “tecnoxaxado”.
A letra fala do convite feito por Juraci para um passeio em um parque. Porém, para espanto do convidado, ao chegar ao tal lugar, percebe que é um simples restaurante self-service por quilo. Por mais que já pareça insólita a situação, a maneira de descrevê-la é fundamental: “Já no caminho eu comi um churrasquinho de charque / E um suco de sapoti / E foi ficando divertido pra caramba / Juraci dançando samba enquanto eu lia O Guarani”. Com a revelação absurda, sua reação vai do choque ao ódio: “Juraci que parque / Juraci que parque / Juraci que parque é esse que eu nunca vi / Juraci que parque / Juraci que parque / Juro por deus que quebrei o pau com Juraci”.
O desapontamento do personagem com a tal mulher é claro e isso é trazido para a letra cantada. Os encaixes entre as palavras no canto e o ritmo sincopado fazem com que algumas frases tenham forte apelo rítmico e tom lúdico, como é típico das cantorias nordestinas, como na embolada, por exemplo. Aqui, observamos a profusão de rimas em “i” (sapoti, Birigui, Guarani) e as construções em duplo sentido: quando cantado, “Juraci que parque” se transforma em “Jurassic Park”, famoso filme do diretor Steven Spielberg, a quem a canção é oferecida. Não posso afirmar, mas a letra engraçada e o tal parque da Juraci soam para mim uma crítica debochada ao absurdo do filme. Mas, isso é mera impressão...
A música é um tecnoxaxado, ou seja, um tradicional xaxado nordestino feito com modernos instrumentos eletrônicos. Assim, o surrealismo da história é acompanhado por samplers de vozes e solos de sintetizador e de uma guitarra distorcida sobre a batida de um baixo eletrônico.
Além disso tudo, Baleiro divide a cantoria com um dos grandes mestres do forró: ninguém menos do que Genival Lacerda, famoso por sucessos como Severina xique-xique. Genival canta trechos e pontua frases, às vezes engraçadas, em diálogo com o compositor.
Já que música e canção são assuntos sérios, este é um espaço para discutir os sons das coisas musicais. Podem ser cantados, tocados, dançados ou ouvidos. Podem também ser altos ou baixos, daqui ou de longe. Não há problema se forem amargos, doces demais ou organizados sob outra lógica. Precisam apenas ser apreciáveis de determinado jeito, entendidos e explicados para que tenham sua beleza revelada. Em suma, é "o som da coisa"!
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segunda-feira, 12 de novembro de 2012
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