domingo, 24 de abril de 2011

Um brilhante disco simples dos Novos Baianos

Depois do primeiro disco, nada melhor do que o segundo de grande sucesso. Foi o que ocorreu com o grupo Novos Baianos em 1972 ao lançar o LP Acabou Chorare, pela Som Livre. Surgido como quarteto, composto por Luiz Galvão, Moraes Moreira, Paulinho Boca de Cantor e Baby Consuelo (do Brasil), neste segundo trabalho Pepeu Gomes, Dadi, Jorginho Gomes e os percussionistas Bola e Baxinho foram incorporados à banda.
Que o LP é um marco na MPB, todos sabem. Que fora eleito por críticos como o mais importante disco da música brasileira, numa enquete feita pela revista Rolling Stone, em 2007, também não é novidade. Que o grupo tem lugar garantido na história musical do país, ninguém duvida. A questão é saber o que fez esse trabalho ter sido assim reconhecido. A resposta não é fácil e se encontra em cada meandro sonoro de cada faixa.
Uma das qualidades está nas letras. Neste caso, o grande responsável é Luiz Galvão, criador das letras normalmente musicadas por Moraes. Seu texto é leve, coloquial e, ao mesmo tempo, certeiro no uso das palavras. Delas, aproveita seus mais profundos sentidos, como em Preta, pretinha, uma das canções mais tocadas dos Novos Baianos. Feita para uma menina que lhe interessava na época, o compositor cria várias situações em que a figura da mulher aparece, porém, sem ser invasivo, sem nomeá-la. Ou ainda na canção que dá nome ao disco. Nela, a ingenuidade das palavras (a autora da expressão “acabou chorare” é Bebel Gilberto que a pronunciou quando pequena) e a meiguice das situações são costuradas numa lenta e sinuosa melodia de bossa nova.
Se algumas letras trazem um trato lúdico com a sonoridade das palavras, como na rítmica frase de Besta é tu, quase metáfora percussiva do samba quando cantada repetidamente, há aquelas que desenham o modo de vida comunitário da banda (que morou num sítio em Jacarepaguá), como em O mistério do planeta, hino à contracultura nacional.

O segundo aspecto importante do disco são os arranjos e performances instrumentais. A regravação de Brasil pandeiro, como sugestão do amigo e incentivador João Gilberto, deu nova cara ao samba exaltação de Assis Valente, lançado em 1940 pelos Anjos do Inferno (Ver post de jan/2010 neste blog), sobretudo pelos solos de craviola e cavaquinho em contraponto feitos por Pepeu Gomes.

Já na canção Tinindo, trincando, além da interpretação de Baby, temos exemplo da antropofágica mistura de rock e baião: rock numa parte com característico riff de guitarra, e baião noutro trecho, porém, mantendo a sonoridade roqueira dos instrumentos. A instrumental Um bilhete pra Didi mostra nos músicos não apenas qualidade técnica, mas também rara sensibilidade por meio das dinâmicas que o arranjo desenvolve.
Acabou chorare fora nada mais do que um disco simples e sincero, com canções bem compostas e muito bem arranjadas. Porém, como tudo que é simples, difícil de fazer bem feito.

domingo, 3 de abril de 2011

Um ano: 1973

Há momentos em que a boa produtividade musical impera. Temos a impressão de que compositores, músicos e bandas se colocam na fila da criação e produzem trabalhos para ficar para a história. Um caso assim foi o ano de 1973.
Por exemplo, 1973 é o ano de lançamento do primeiro disco de Bob Marley e os Wailers na Inglaterra, o clássico do reggae Catch a fire. É também o ano de lançamento de um dos melhores discos do chamado rock progressivo: Dark side of the moon, do Pink Floyd, exemplo bem acabado de disco conceitual, aquele em que todas as faixas carregam faces de um conceito. É o terceiro disco mais vendido de todos os tempos.
Na mesma área do progressivo, o ano guarda a terceira formação (e uma das melhores!) do grupo King Crimson, do guitarrista Robert Fripp, com o disco Larks’ tongues in aspic. O inglês Jethro Tull lançou, também neste ano, o álbum A passion play que, se não foi o melhor da carreira, marcou positivamente a cena do progressivo.
Outra banda inglesa que deixou marcas em 1973 foi o Yes, com seu primeiro disco ao vivo, o triplo Yessongs, um exagero dentro dos padrões da indústria fonográfica. Também o Gênesis brindou o ano com seu primeiro álbum ao vivo, ainda com Peter Gabriel nos vocais.
The Who continuou sua saga em óperas-rock e gravou, em 1973, o duplo Quadrofenia, em que mostra a esquizofrenia do personagem central dividido pelas personalidades dos quatro integrantes da banda: Roger Daltrey, Pete Townshend, Keith Moon e John Entwistle.
Se pensarmos no rock pesado, nesse ano veio à luz Sabbath bloody Sabbath, um dos discos mais importantes do Black Sabbath, grupo liderado por Ozzy Osbourne e Tony Iommi. Houve também o Houses of the Holy, quinto álbum do Led Zeppelin. E, para completar, apareceram os discos de estreia do Aerosmith e do Queen, ambos homônimos.
No pop, foram fundamentais o duplo Goodbye yellow brick road, grande sucesso de Elton John, Band on the run, um dos mais vendidos do Wings, grupo de Paul McCartney pós-Beatles, e o LP Music and me, de Michael Jackson.
Enquanto isso, em terras brasileiras, surgiam para nossos ouvidos Krig-Ha bandolo, primeiro de Raul Seixas (com as clássicas Ouro de tolo, Metamorfose ambulante e Mosca na sopa), Secos e Molhados, disco de estreia do grupo que soube juntar sucesso comercial (com O vira e Sangue latino) e experimentalismo (com Rondó do capitão e As andorinhas) e Pérola negra, primeiro álbum de Luiz Melodia. Na área mais MPB, tivemos o Tim Maia - vol. 4, com os sucessos Gostava tanto de você e Réu confesso, e os excelentes Matita Perê, de Tom Jobim, e Milagre dos peixes, de Milton Nascimento.
Porém, como o mundo não é só alegria, a nota triste de 1973 ocorreu em 17 de fevereiro com o falecimento de Alfredo da Rocha Vianna Filho, o mestre Pixinguinha.