Nos anos 1970, o policial aposentado José Mendes da Silva morava no morro do Pau da Bandeira, ao lado do Morro dos Macacos, no bairro carioca de Vila Izabel. Conhecido como Zé do Caroço e dedicado às causas de sua comunidade, colocou um alto-falante na laje da sua casinha para transmitir notícias importantes aos moradores da redondeza. Até que a esposa de um militar que morava na rua Petrocochino, próxima do morro, reclamou à polícia que o barulho do serviço de alto-falante a incomodava quando assistia à novela.
A história da ação contra a comunidade na época da ditadura foi contada à compositora Leci Brandão que com o tema compôs, em 1978, o samba Zé do Caroço. De tom engajado, a letra retrata o nascimento de um líder comunitário que batalha e “que malha o preço da feira” para ganhar a vida. Diz que ele defende seu povo e o direito deles à informação alternativa, fora, portanto, da alienante televisão “que distrai toda gente com sua novela”. Por isso é “que o Zé bota a boca no mundo/ Ele faz um discurso profundo/ Ele quer ver o bem da favela”. Noutro trecho, a compositora lamenta não haver uma figura como essa no morro da Mangueira, local que frequentava há anos, para mostrar a todos que “Carnaval não é esse colosso/ Nossa escola é raiz, é madeira”.
A composição tem a cara de Leci Brandão, figura ligada à Mangueira, à cultura popular e às causas sociais. De ritmo acelerado e perfil de samba de raiz, a canção foi proibida pela gravadora Polydor quando a sambista iniciava as gravações de seu sexto disco, que sairia em 1981. Não contente e determinada, rescindiu contrato e só gravou outro LP em 1985, já na gravadora Copacabana, com a polêmica faixa no repertório.
Zé do Caroço não é obra datada. Ao contrário, tem vida longa e se desdobra em beleza quanto mais antiga fica. Suas regravações são prova disso. No seu primeiro disco, em 1993, o grupo paulista Art Popular registrou o samba. Em 2000, o grupo carioca Revelação, também em seu primeiro trabalho, incluiu Zé do Caroço.
Se em ambos a estrutura rítmica foi mantida, Seu Jorge deu-lhe nova roupagem, no DVD de 2005 com Ana Carolina, e mostrou como o tema continuava atual. Com sua voz grave e potente e apenas o violão, o cantor diminuiu o andamento para tornar o samba mais arrastado e escancarar a densidade da letra. No ano seguinte, era a vez de Mariana Aydar, também em seu primeiro disco (Leci é madrinha de muitos!), render homenagem ao clássico regravando-o na cadência lenta e com mais introspecção. Por fim, novamente na voz de sua criadora, a música entrou na trilha sonora do filme Tropa de Elite 2, uma das maiores bilheterias do cinema nacional.
O seu José Mendes da Silva faleceu no início dos anos 2000, sabendo que sua história fora imortalizada cantada em verso e prosa. Só não presenciou a instalação de uma Unidade de Polícia Pacificadora no Morro dos Macacos no final de 2010 para acabar com a influência de traficantes. Mas, a novela da TV continua...
Muito interessante conhecer a história dessa música. Era mais ou menos assim que eu imaginava, mas não sabia que se tratava de fatos reais.
ResponderExcluirADORO ESTE SAMBA E OUTROS DA GRANDE ARTISTA LECI BRANDÃO.E ONTEM DEPOIS DE UMA CONVERSA SOBRE ESTA MUSICA RESOLVI PESQUISAR PARA SABER QUEM FOI ZÉ DO CAROÇO? ENCONTREI A RESPOSTA AQUI,ADOREI SABER MAIS. OBRIGADA
ResponderExcluirGostaria de saber se Ze do Caroço era negro, pois estou fazendo um trabalho e gostaria de incluir sua história. O trabalho é sobre a história do negro na música brasileira.
ResponderExcluirMuito interessante, obrigado por me esclarecer essa história!
ResponderExcluirQuantos "Zés do Carroço" (sic) existem e não damos o seu devido valor.Como é bom escutar uma canção cuja letra é tão simples, mas tão forte. Leci Brandão e sua voz serão sempre imortalizados por aqueles que gostam de uma boa canção.Reverberaram bem essa estoria e tantas outras que ficam esquecidas nas páginas esquecidas da vida...
ResponderExcluirSou cantora e o Samba da Leci Brandao Ze do Caroco de simples nao tem nada, tenta cantar pra voce ve coomo eh dificil. Um Samba lindo engajado comovente, politico e pra sempre um classico.
ResponderExcluirA primeira vez que escutei esse samba foi ao vivo em show dá Leci Brandão, fiquei intrigado. Um sabe muito forte. E agora fiquei satisfeito em saber que existiu de fato um Zé do Caroço. Um samba eterno.
ResponderExcluirConheci a música Zé do Caroço pelo grupo Revelação, isso foi por volta de 2000, ou 2001. Gostei muito da letra, fora também do ritmo acelerado. E agora, conhecendo mais uma pouco de história, irei gostar mais dela.
ResponderExcluirParabéns pelo texto e pelo blogger
sds Ciriaco
Prestei atenção na música no filme tropa de elite 2 e baixei a gravação do grupo Revelação, muito interessante a história da vida real sendo traduzida em um grande samb.
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ResponderExcluirFico muito honrada em ver essa história maravilhosa,zé do caroço era o meu tio, pessoa marcante e inesquecível para todos nós da família.
ResponderExcluirInteressante... Profunda!
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