sábado, 19 de fevereiro de 2011

A contracultura do Grand Funk Railroad

A contracultura, movimento amplo de reação aos padrões estabelecidos que vigorou nos EUA e no mundo ocidental entre o final dos anos 1960 e início dos 1970, teve o rock como principal trilha sonora. Se a proposta contracultural era pacifista e libertária e se colocava em oposição aos padrões morais de comportamento e às posições políticas tradicionais, o rock foi uma espécie de revolta contra a tradição da música. A partir dele, ganham importância a guitarra, os cabelos compridos, o corpo, o grito e o blues negro.
Muitos grupos partilharam a novidade, pautados pela criatividade musical que surgia, dentre eles o Grand Funk Railroad. Lançado em 1969, a base da banda foi o trio Don Brewer (bateria e voz), Mark Farner (voz, guitarra e teclados) e Mel Schacher (baixo), empresariados e produzidos por Terry Knight. Seu curioso nome foi adaptado de uma estrada de ferro de Michigan chamada Grand Trunk Western Railroad. O sucesso com a apresentação no Atlanta Pop Festival, em julho de 1969, levou o grupo a gravar logo dois LPs entre agosto e dezembro: On Time e The Red Album.
Sua música era crua, produzida pelo básico power trio, e dançante, fundada no rhythm and blues e na psicodelia. A performance no palco era uma das marcas: a voz aguda de Farner, quase sempre sem camisa, o timbre da guitarra, os vocais de Brewer e os três cabeludos, como rezava a estética do período.

Outra característica foi o engajamento presente em algumas letras. Neste ponto, a contracultura do GFR ganha ares mais politizados, sem ser partidária, sobretudo nos primeiros álbuns, até 1972, quando trocam o empresário e colocam o tecladista Craig Frost. As mensagens eram contra a guerra e a sociedade careta e pediam aos jovens para terem posturas mais livres. No disco E Pluribus Funk há três faixas exemplares. Em People, let’s stop the war, a letra clama contra o governo que leva seus cidadãos à guerra; em Save the land, a proposta é todos se juntarem para fazer com que o mundo sobreviva; por fim, a letra de No lies diz: “Apenas escute o que digo, porque estou falando com você/ Não precisamos de líder para nos dizer o que está errado/ Precisamos de amor no país e assim podemos ser fortes”.
Apesar desse caráter, suas músicas não se limitavam ao conteúdo ativista. Havia canções de amor (como Heartbreaker ou Some kind of wonderful), um cover dos Rolling Stones (Gimme Shelter) e gravações mais alegres em homenagem ao corpo e à dança, como em Footstompin’ music ou The locomotion, ambas de grande sucesso, ou We’re an American band, cantada pelo baterista Brewer.

O último disco apareceu em 1976. Produzido por Frank Zappa, Good singin' good playin' foi lançado em agosto, mas não conseguiu segurar a banda. Os membros do Grand Funk acabaram por se separar em outubro, encerrando um caminho libertário e criativo no rock.

quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

Catch a fire - a marca do reggae

Há discos que marcam a história da música popular. Um deles é Catch a fire, primeiro LP de Bob Marley and The Wailers, gravado entre Jamaica e Inglaterra. Antes desse lançamento, o raio de ação do reggae limitava-se aos bairros pobres de Kingston; depois dele, o gênero espalhou-se pelo mundo da música pop. Outra importância do álbum foi ter quebrado a regra dos produtores jamaicanos da época de apenas produzir singles, compactos com duas músicas e capas simples, mais baratos e rentáveis. Tudo isso sem falar na capa com a foto de Marley fumando um baseado (maconha é elemento importante para o rastafarianismo!), bem diferente do que se fazia nas capas de discos da época.
Catch a fire, gravado em 1972 e lançado em 1973, foi importante ao mostrar que um grupo de reggae podia fazer um trabalho coeso, com músicas criadas com liberdade e sem pressões comerciais. A gravadora que bancou o projeto foi a Island Records, selo inglês de Chris Blackwell, jamaicano nascido na parte rica de Kingston e filho de ingleses. Produtor antenado com o que acontecia na ilha desde a década de 1960, Blackwell apostou no sucesso que Marley e os Wailers representavam e resolveu lançá-los no mercado europeu.
Os Wailers foi criado como grupo vocal por três parceiros: Marley, Bunny Livinston e Peter McIntosh (ou Peter Tosh). Entre 1969 e 1970, entrou na banda a melhor “cozinha” musical do gênero: os irmãos Aston e Carlton Barret, respectivamente, baixista e baterista.
Surgido nos anos 1960, o reggae era um novo ritmo afro-caribenho criado a partir do ska, do rock steady (um mais dançante e outro mais lento e introvertido) e de gêneros norte-americanos como rhythm and blues e soul music. Seu andamento meio lento, os acentos nos tempos fracos do compasso e as sutis frases rítmicas do baixo e da bateria, com toques por vezes levemente adiantados ou atrasados, deram um brilho diferente e devem ter causado certo frisson nos ouvidos europeus.
Além da rítmica peculiar, as letras com temáticas sociais das canções do álbum compostas por Marley ou Tosh revelam outra origem do gênero: os bairros pobres de Kingston, como Trench Town. Letras que falam da escravidão que persiste no dia-a-dia dos pobres (como em Slave driver), da dificuldade da vida nas cidades (em Concrete jungle, também nome de uma região violenta da capital jamaicana), a necessidade de fazer um movimento contra a exploração (em 400 years), mensagens de paz e felicidade (em No more trouble), mas que não deixam de falar de amor (como no sucesso Stir it up).

Depois de Catch a fire, o mundo nunca mais esqueceu o poder de encantamento do reggae. Bom motivo para lembrar do aniversário de Bob Marley, que faria 66 anos no próximo dia 6 de fevereiro não tivesse um câncer lhe tirado a vida em 11 de maio de 1981. Outro motivo para ouvir a cantora Céu e seu arranjo para Concrete jungle.