sábado, 22 de dezembro de 2012

O fim do mundo em duas versões

Pronto. Hoje já é dia 22 de dezembro de 2012 e o mundo não se acabou.
Pode parecer insólita a atual interpretação enviesada do tal calendário maia, mas a questão é que um ou outro deve ter acreditado mesmo no apocalipse em pleno início de verão. A posição dos números e a mística do antigo povo devem ter abalado a neurose da vida que se leva por aqui. Mesmo que fosse apenas uma notícia engraçada, mesmo que disséssemos que não acreditávamos nesse fim, a verdade é que lá no fundo, bem no fundo, alguns devem ter tratado de fazer aquilo que não fizeram até agora.
Curiosamente, a música brasileira traduziu esses sentimentos e sensações em, no mínimo, dois momentos, com duas ênfases distintas. A primeira foi com o mestre Assis Valente, que compôs E o mundo não se acabou, gravada em 1938 por Carmen Miranda e regravada por Adriana Calcanhoto em 2000. Nesse samba-choro, cheio de bossa e brejeirices, Carmem canta as loucuras que chegou a fazer a partir de um boato sobre o fim do mundo.

A rigor, a letra mostra os desejos que, nos anos 1930, não poderiam ser saciados. A notícia, pura “conversa mole”, indicava uma oportunidade que não poderia ser perdida! Como se corria o risco de o caos ser mesmo instaurado (como o sol nascer antes da madrugada), a personagem tratou de aproveitar a situação para descontar tudo que lhe era proibido: “E sem demora fui tratando de aproveitar/ Beijei a boca de quem não devia/ Peguei na mão de quem não conhecia/ Dancei um samba em traje de maiô”. Como a história era boato, tudo se complicou com as consequências: “Chamei um gajo com quem não me dava/ […] E festejando o acontecimento/ Gastei com ele mais de um quinhentão/ Agora eu soube, que o gajo anda/ Dizendo coisa que não se passou”.
Esse jeito feliz de festejar o fim do mundo não aparece na composição de Paulinho Moska e Billy Brandão, O último dia, gravada por Moska em 1995.

A música, de cadência lenta e marcial, revela certa melancolia, sobretudo nos solos de violoncelo. Na letra, não é mais o personagem alegre que age com a hipótese do fim próximo, mas é ele quem questiona seu amor sobre o que faria no caso de ser aquele o último dia. Se os desejos não são mais tão nítidos, revelam-se as críticas do personagem à pessoa amada e à vida. Por exemplo, ele pergunta se a figura não iria ao shopping ou à academia “Pra se esquecer que não dá tempo/ Pro tempo que já se perdia”. Ou ainda, demonstra que seu interlocutor é superficial em sua vida ao questionar: “Ia manter sua agenda/ De almoço, hora, apatia/ Ou esperar os seus amigos/ Na sua sala vazia”.
Agora, entre essas duas opções, me diga você: o que faria se só lhe restasse o dia de hoje?

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